Quem sou? De onde venho? Para onde vou?
As crianças logo se tornam curiosas. Uma criança de três
anos pode fazer perguntas que os adultos não conseguem responder.
Uma de cinco anos pode refletir sobre os mesmos enigmas que um
idoso.
A necessidade de se orientar na vida é fundamental para os
seres humanos. Não precisamos apenas de comida e bebida, de calor,
compreensão e contatos físicos; precisamos também descobrir por
que estamos vivos.
Nós perguntamos:
*
Quem sou eu?
*
Como foi que o mundo passou a existir?
*
Que forças governam a história?
*
Deus existe?
*
O que acontece conosco quando morremos?
Essas são as chamadas questões
existenciais, pois dizem
respeito a nossa própria existência.
Muitas questões existenciais são bastante gerais e surgem
em todas as culturas. Embora nem sempre sejam expressas de
maneira tão sucinta, elas formam a base de todas as religiões. Não
existe nenhuma raça ou tribo de que haja registro que não tenha tido
algum tipo de religião.
Em certos períodos da história, houve gente que colocou
questões existenciais numa base puramente humana, não religiosa.
Mas foi só há pouco tempo que grandes grupos de pessoas pararam
de pertencer a qualquer religião reconhecida. Isso não implica
necessariamente que tenham perdido o interesse pelas relevantes
questões existenciais.
Alguém já disse que viver é escolher. Muitas pessoas fazem escolhas
sem pensar com seriedade se estas são congruentes, ou se
existe alguma coerência em sua atitude com relação à vida. Outras
sentem necessidade de moldar a atitude delas de maneira mais
abrangente e estável.
Cada um de nós tem uma visão da vida. A questão é: até
que ponto fomos nós mesmos que a escolhemos, até que ponto ela é
nossa própria visão? Até que ponto estamos conscientes de nossa
visão?
Face a face com a morte
Duas histórias reais demonstram como a vida cotidiana pode
estar interligada a profundas questões existenciais. A primeira se
passou durante a Segunda Guerra Mundial; a outra, na América
Central de nossos dias.
Quando
Kim Malthe Bruun tinha dezessete anos, a guerra
estourou e ele testemunhou a profanação de importantes valores
humanos por parte de uma potência estrangeira invasora. Após um
ano, em 1941, Kim foi ser marinheiro, mas no outono de 1944
desembarcou na Dinamarca e entrou no movimento ilegal de
resistência. Alguns meses depois acabou preso pelos alemães, e em
abril de 1945 foi condenado à morte e fuzilado.
Não era raro os jovens assumirem a luta contra a ditadura
nazista. Se ela acontecesse hoje, talvez você e seus amigos também se
envolvessem nessa luta. Como você acha que reagiria se fosse
condenado a morte? O que escreveria quando os guardas da prisão lhe
dessem lápis e papel para que você deixasse uma última carta a seus
parentes mais próximos?
O que Kim escreveu, nós sabemos. A última carta para sua
mãe contém a seguinte passagem:
Hoje Jörgen, Niels, Ludvig e eu nos apresentamos diante de
um tribunal militar. Fomos condenados à morte. Sei que você é uma
mulher forte e conseguirá suportar tudo isso, mas quero que
compreenda. Eu sou apenas uma coisa insignificante, e como pessoa
logo serei esquecido; mas a idéia, a vida, a inspiração de que estou
imbuído continuarão a viver. Você as verá em todo lugar
— nas
árvores na primavera, nas pessoas que encontrar, num sorriso
carinhoso.
Em março de 1983,
Marianella Garcia Villas foi assassinada pelos
militares na república centro-americana de El Salvador. Fazia vários
anos que as forças do governo e os guerrilheiros rebeldes travavam
uma feroz guerra civil. Durante essa guerra, uma facção do Exército,
juntamente com extremistas, havia raptado e assassinado milhares de
pessoas. A jovem advogada Marianella formou um comitê de direitos
humanos para investigar casos de desaparecimento e tortura. Em
decorrência, acabou indo para a "lista negra" dos terroristas. Ela
sabia que sua vida corria perigo.
Como você teria reagido a uma ameaça desse tipo? A reação de
Marianella foi continuar a luta. No início de 1983, ela visitou uma
das zonas de guerra, numa missão do Comitê de Direitos Humanos.
Ela nunca mais voltou. Porém, uma carta que escreveu em 1980 nos
conta qual era o impulso que a movia:
Eu luto pela vida: um trabalho real, que vale a pena. Não
tenho nenhum desejo de morrer, mas já vivi tão perto da morte e de
suas consequências que a vejo agora como algo natural. Todos nós
devemos morrer um dia, mas a morte
sempre virá cedo demais para o
homem
ou a mulher que tem uma intensa sede de viver. Cada minuto
que passa tem um significado, uma profundidade maior do que
qualquer outra coisa,
mesmo que pareça comum e rotineiro. Cada
rajada de vento, cada canto da cigarra, cada revoada de pombos é como
um poema.
Sei que os que trabalham pela justiça sempre terão o direito a
seu lado e receberão a ajuda de Deus; estes irão prevalecer, e a
verdade resplandecerá.
É melhor ser rico de espírito do que em bens materiais.